EDGAR GASTÓN JACOBS FLORES FILHO – REVISTA GESTÃO UNIVERSITÁRIA – 24/02/2015 – BELO HORIZONTE, MG O Fundo de Financiamento ao estudante do Ensino Superior – FIES é a base de um dos maiores programas de inclusão já desencadeados pela União. Juntamente com o PROUNI este fundo contábil propiciou o acesso de estudantes com renda baixa […]
EDGAR GASTÓN JACOBS FLORES FILHO – REVISTA GESTÃO UNIVERSITÁRIA – 24/02/2015 – BELO HORIZONTE, MG
O Fundo de Financiamento ao estudante do Ensino Superior – FIES é a base de um dos maiores programas de inclusão já desencadeados pela União. Juntamente com o PROUNI este fundo contábil propiciou o acesso de estudantes com renda baixa aos cursos superiores, promovendo ampliação da capacitação profissional, enriquecimento pessoal e oportunidades para milhares de pessoas.
Contudo, parece que em 2015 está para acontecer uma guinada no programa que o tornará mais elitizado e o transformará num instrumento indireto de política econômica, suplantando, na prática, parte dos seus objetivos iniciais.
A elitização ocorrerá porque no mês de março passará a ser exigível um percentual mínimo de desempenho no ENEM e, especialmente, na redação. Ora, se o financiamento é para quem precisa de apoio econômico do Estado, o principal critério, senão o único, deve ser a renda familiar, até porque esse é o critério previsto em Lei.
Na verdade, o que se cria é um vestibular de segunda classe, que pouco avaliará a qualidade e provavelmente repetirá o erro histórico das universidades públicas: oferecer vantagem econômica para aquele que não é, de fato, o cidadão mais necessitado.
Talvez, nesse caso, o que se pretenda é reduzir o volume de recursos do FIES e responsabilizar os estudantes por essa diminuição.
Esta mesma transferência de responsabilidade parece existir no caso da limitação de reajuste dos encargos educacionais, anunciada oficialmente no dia 12 de fevereiro pelo Ministério da Educação.
Segundo representantes do órgão, somente serão aceitas alterações cadastrais no FIES para fins de revisão dos preços das mensalidades se estes forem inferiores à inflação. Tal situação já vinha sendo observada há quase um mês, pois uma limitação no sistema impedia a alteração com variação superior a 4,5%, contudo, no dia 12, o MEC reconheceu que provocou tal limitação e, mostrando-se um pouco mais coerente, elevou o teto de reajuste para 6.4%.
Ora, o reajuste e revisão de preços dos encargos educacionais, popularmente conhecidos como mensalidades escolares, são regulados por lei e controlados por planilha de custos criada pela União e na lei específica não consta qualquer tipo de limitação vinculada a índice geral de inflação.
Se custos com docentes, com aperfeiçoamento da infraestrutura, com alterações curriculares e até mesmo com variação de tributos justificam uma alteração de preço – tecnicamente denominada revisão, diferentemente do reajuste, que teria fundamento em um índice previamente pactuado – é totalmente ilegal a conduta de impor uma limitação por meio do sistema eletrônico do FIES. Na realidade, já seria incorreta uma limitação por meio de decreto ou portaria e, por isso, torna-se ainda mais grave e arbitraria a imposição de uma espécie de desconto para a instituição que desejar continuar contratando com o fundo.
Esse tipo de desconto forçado, além de quebra de contrato é infração concorrencial gravíssima, que se enquadra na proibição contida no Art. 36, § 3º, IX, da Lei 12.529/2011: impor a parceiros comerciais (distribuidores, varejistas e representantes, por exemplo) descontos ou quaisquer outras condições de comercialização relativas a negócios destes com terceiros. E esta conduta tem como consequência um problema de sustentabilidade financeira.
Frise-se que a Lei 10.260/2001 prevê que o fundo financiará “até 100% (cem por cento) dos encargos educacionais cobrados dos estudantes por parte das instituições de ensino” (Art. 4º), deixando claro que o FIES deve pagar o que – licitamente, é óbvio – for cobrado pela instituição de ensino. Além disso, há regra no sentido de que “os encargos educacionais […] deverão considerar todos os descontos regulares e de caráter coletivo oferecidos pela instituição” (Art. 4º, § 4º) o que implica, por simetria, na obrigação do agente financiador considerar todos os acréscimos regulares de caráter coletivo no preço.
Enfim, parece, também nesse segundo tópico, que o MEC usa o discurso do controle de reajustes como um meio para reduzir o volume de recursos usados no FIES. Ao fazer isso, age como um monopolista que usa seu poder econômico para coagir seus parceiros a ofertar descontos, buscando ter tratamento favorecido em relação aos demais contratantes.
O problema é que os demais contratantes são estudantes que acabarão sendo prejudicados por problemas no equilíbrio econômico-financeiro da instituição, assim como serão os já mencionados postulantes aos cursos e aos financiamentos que não forem “aprovados” no ENEM.
Nesse contexto, pode-se pensar que a melhor política, a mais justa, talvez fosse a transparência. O Poder Público deveria informar a sociedade que os recursos para o FIES terão de diminuir nesse momento de ajuste econômico. Assim, terminaria a onda de boatos e opiniões pouco fundamentadas que tentam fazer com que os estudantes carentes sejam culpados por seu destino em virtude da falta de méritos e as instituições de ensino em razão de supostos excessos nos reajustes