Em 2030, a população de 60 anos já terá quase dobrado e, em 2040, aproximadamente 57% dos recursos humanos do país serão compostos por pessoas com mais de 45 anos, segundo estimativas do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). O mercado precisa se adequar desde já para a inversão da disponibilidade de jovens, mas não […]
Em 2030, a população de 60 anos já terá quase dobrado e, em 2040,
aproximadamente 57% dos recursos humanos do país serão compostos por
pessoas com mais de 45 anos, segundo estimativas do Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). O mercado precisa se adequar desde
já para a inversão da disponibilidade de jovens, mas não é isso o que
tem sido feito. As empresas ainda levam em consideração a idade na hora
de contratar e não veem os profissionais mais velhos como solução para o
problema da escassez de mão de obra qualificada. De acordo com estudo
da consultoria PwC e da Escola de Administração de Empresas de São Paulo
da Fundação Getúlio Vargas (FGV-EAESP), 75 % dos profissionais
contratados pelas empresas têm menos de 45 anos (veja o gráfico).
Para
os especialistas, esse é o momento de as organizações invistirem em
formação específica e resgatarem o conhecimento acumulado por
funcionários com anos de vivência profissional. Segundo o estudo, 94%
das companhias acreditam serem os conhecimentos trazidos por eles o
principal benefício. Embora reconheçam as vantagens, as empresas
dispensam maior atenção para os mais jovens no momento de recrutar: 63%
acreditam que os mais velhos estão acomodados com a aposentadoria e,
portanto, acabam não oferecendo oportunidades de carreira para eles.
Tampouco porporcionam flexibilidade de horários e de locais de trabalho,
os itens mais valorizados por profissionais que pretendem continuar
ativos no mercado de trabalho.
Estilos diferentes
Wagner Pereira, 48 anos, acredita que trabalhadores com mais experiência podem repassar conhecimento aos jovens
As
pessoas geralmente me procuram pelo tempo de experiência que tenho e
por reconhecerem a forma com que levo meu trabalho%u201D Goiandira
Lopes, vendedora de carros
Contratado pela CTIS Printing Center
no ano passado, o gerente comercial Wagner Pereira, 48 anos, acredita
que profissionais com maior vivência têm papel importante, pois repassam
conhecimento aos mais jovens. Ele gerencia uma equipe de colaboradores
de diferentes idades e conta que a variedade de estilos ajuda na troca
de experiências entre as duas gerações. Segundo Wagner, é essencial
manter-se atualizado, afinal, ninguém pode continuar no mercado sem
buscar desafios. “Isso é latente, tem que estar na veia. Uma pessoa com
mais de 40 anos de idade possui conhecimentos para complementar a
vivência dos mais jovens, e evitar que ele se perca”, relata. “Lidamos
um pouco melhor com estresse e temos mais habilidade em conduzir as
diferenças. Pensando em termos de organização, eu acho que esse é o
caminho.” Já a mente aberta e a facilidade para aprender dos jovens,
principalmente em relação a novas tecnologias, na opinião dele,
complementam os diferenciais agregados pelos profissio nais com mais
bagagem.
“A pesquisa serviu para sensibilizar as empresas a
respeito de um paradigma antigo: a percepção de que somos um país de
jovens e de que sempre haverá abundância para suprir as necessidades.
Isso não é verdade”, relata o coordenador da pesquisa João Lins, sócio
da PwC Brasil. Segundo ele, uma das conclusões mais relevantes é a de
que as empresas não criam modelos de carreira diferenciados para pessoas
que se aproximam da aposentadoria. “O processo de envelhecimento da
população abre um leque de possibilidades e as organizações precisam
estar mais atentas para isso”, explica ele, que também é professor de
administração.
O que acontece, muitas vezes, é que o funcionário
não quer continuar na mesma função, pois o sucesso que conquistou no
passado não é mais valorizado hoje em dia. Por isso, sentem-se
desmotivados. As empresas, no entanto, reconhecem que a maturidade
agrega valor ao funcionário. De acordo com a pesquisa, 96% delas
acreditam que eles possuem maior equilíbrio emocional e 86% acham que
eles estão mais preparados para a resolução de problemas. Contudo, 89%
não possuem nenhum modelo de carreira que permita absorver esses
benefícios para o bem do negócio. Montar equipes multigerenciais, por
exemplo, permitiria realocar pessoas e aproveitar melhor as competências
de cada um. “Em um país onde há escassez de talentos e deficiências no
sistema educacional, esperava-se que as empresas investissem na
colocação de pessoas mais velhas nessas atividades”, destaca João Lins.
Mas
não é só uma questão de reter o funcionário por mais tempo. Lins
acredita que os recrutamentos feitos, se não contam com uma atuação
proativa para captar o profissional maduro, não deveriam se ater a um
viés negativo relacionado a idades avançadas. “É preciso garantir que o
processo não exclua profissionais mais velhos e que tenham potencial de
fazer contribuições interessantes para a empresa.” Segundo ele, há seis
anos o Brasil forma a mesma quantidade de engenheiros, apesar do esforço
de se melhorar o sistema de ensino, o que demonstra a necessidade de se
investir nos profissionais mais experientes que ainda tenham vontade de
permanecer no mercado.
Muitas vezes, contratá-los é questão de
necessidade. Para Fernando Luis Dias, diretor da área de consultoria da
Career Center, alguns setores estão buscando exatamente esse tipo de
profissional. A forte demanda de mão de obra em alguns setores, como
construção civil, siderurgia e petroquímica, evidencia isso.
Além
da enorme oferta de emprego para profissionais mais jovens, os
segmentos também vivenciam uma reciclagem crescente. “São setores que
acabaram não desenvolvendo pessoas em número suficiente para atender a
demanda do mercado e buscam até mesmo profissionais já aposentados, pela
falta de gente com experiência”, explica ele. “Eles não estão
procurando um vínculo tão regular de trabalho, porque, nessa fase, a
maioria tem outros interesses e quer conciliar a oportunidade ao
desenvolvimento profissional”, completa. Por isso, ainda segundo o
especialista, cargos de consultoria e de prestação de serviço são as
ocupações preferidas desses profissionais.
Vivendo e aprendendo
“As
pessoas geralmente me procuram pelo tempo de experiência que tenho e
por reconhecerem a forma com que levo meu trabalho. Como já fui
secretária executiva, costumo ser muito organizada e disciplinada”
afirma Goiandira Lopes, 53 anos, vendedora de carros da concessionária
Saga Hyundai. Know how, vivência e contato com o público foi o que
ajudou Goiandira a moldar seu perfil para lidar com o mercado de
trabalho ao longo dos anos. Ela conta que treinar colegas mais jovens é
gratificante, mas é preciso ficar atento a novas possibilidades de
aprendizado. “A gente nunca sabe tudo. Toda vez que alguém ensinar
alguma coisa, fique calado e absorva tudo o que puder, e assim vai
agregar ainda mais conhecimento ao que já sabe”, aconselha.
A
vendedora diz que percebe a ansiedade dos jovens, característica que
pode atrapalhar até aqueles mais capacitados. “Treinei um jovem que
estava com muita sede de trabalhar, mas inseguro. Apesar de não ser
fácil, mostrei para ele que o mais importante é saber lidar com o
cliente e ser organizado. Se você oferece um bom atendimento e tratando
com delicadeza, o resto, flui naturalmente”, conta.
O
sócio-consultor da empresa de planejamento estratégico Positiva Brasil,
Evandro Santos, explica que o jovem é muito imediatista e espera crescer
rápido, por isso, são frequentes os desligamentos da empresa quando o
crescimento na carreira demora para ocorrer. “As pessoas mais velhas já
galgaram degraus e, agora, querem transmitir conhecimento, sentirem-se
úteis no ambiente de trabalho. O objetivo delas não é o de sair, é de
permanecer.”
Por Correio Braziliense/DF